APLICATIVOS DE RELACIONAMENTO? POR QUÊ NÃO?

 

Yuval Harari, historiador israelense e autor do Best Seller Homo Deus: Uma breve história do amanhã, disse numa de suas entrevistas que o sentimento de satisfação dos seres humanos não depende exclusivamente de condições objetivas, mas, depende também do que eles imaginam produzindo expectativas com relação ao presente e ao futuro. Segundo ele, as condições objetivas melhoraram muito a partir das últimas gerações, não significando isto que as pessoas estejam mais satisfeitas que antes – suas expectativas é que aumentaram – e, paradoxalmente, a História mostra que até quando há crescimento social e econômico, as pessoas podem estar mais insatisfeitas porque suas expectativas se tornam maiores; e o que gera uma crise é quando as expectativas estão muito altas e o crescimento não prossegue, pois nenhum crescimento é ilimitado, disse Harari.

As expectativas não são sentimentos, são projeções cognitivas que atuam como variáveis, advindas geralmente de experiências passadas, que se dirigem ao presente, ou bem melhor ao futuro, como forma de antecipá-lo; ou seja, as expectativas têm que ver com resultados imaginados – desejados ou não – quer o contexto seja positivo, quer negativo. Alguma coisa vai acontecer, e se não há certeza ou garantia de como será, aparecem as expectativas alimentadas pela incerteza. Se num contexto positivo as expectativas não se efetivam, o resultado será uma decepção, e os exemplos, onde se as põem, são inúmeros: um concurso, uma eleição, uma viagem, ou conhecer uma pessoa. Aqui as expectativas podem assumir um caráter exigente e de demandas, prejudicando o anterior encanto do relacionamento. Quem vê o outro como aquele que deva ser como se espera dele, é isto enfocar-se só numa possibilidade que, sem dúvida, levará à frustração como produto de uma ilusão. Um dos grandes fardos da vida é querer ou ser forçado a corresponder às expectativas dos outros quanto à conduta de como se comportar; no fundo ninguém está no direito de corresponder ao que se espera dele, e aquele que espera mais do que o outro pode dar, cai sempre em decepção.

Eu, que tenho a tendência de sempre buscar fundamentos nos fatos, aonde quero chegar com esses conceitos que me custaram leituras e reflexão? Ao fato bastante comum hoje em dia de se usar as redes sociais como um meio de conhecer pessoas para um eventual relacionamento. Antes – quando por meio de cartas – esse meio era visto como não confiável e negativo; hoje, porém, estamos na era em que os meios digitais comandam nossa vida; meu Smartphone mede apenas treze centímetros – e não é um dos últimos modelos, – mas com ele posso abarcar o mundo, e se não o faço, preferindo ir ao computador, é pelo elementar prazer de não me sujeitar a uma coisa pequena e tão poderosa. Eu sou uma exceção; a maioria das pessoas usa o celular de modo generalizado, e por que não para conhecer alguém? Sim, por meio de aplicativos específicos, e um deles de alcance internacional é o Tinder. Este aplicativo é fácil de ser manejado e grátis numa de suas utilizações; nele homens e mulheres têm acesso a uma imensa galeria de pessoas, como um álbum de fotografias infinito, por que sempre aparecem mais ofertas, mais possibilidades, mais chances. Muitos podem encontrar nele seus parceiros, mas não acho que por sorte ou garantia dada pelo aplicativo; é que essa forma de conhecer pretendentes já se proliferou tanto que ela leva a que as formas clássicas fiquem um tanto desleixadas – quem passa muito tempo por dia com a cabeça afundada nesses tais aplicativos, deixa de ver o que passa ao redor – e isto tem que ver com expectativas. Se não fossem estas somadas às esperanças, os tais aplicativos não teriam tantos seguidores. Refiro-me aqui menos ao seu uso visando uma paquera inconsequente, mais ao uso daqueles que querem conhecer uma pessoa com o fim de um relacionamento pra valer, como sendo esse até o último recurso para encontrar o companheiro de vida.
Conhecer alguém fora desse formato é o que hoje me surpreende; ele é muito simples – tudo se faz com as mãos como se uma varinha mágica fosse um coração verde e movendo-o para a direita quando a foto de alguém junto a uma curta descrição dela agradam. E o melhor é quando esse alguém vendo a foto, também move a varinha mágica, ou seja, o coração verde, para a direita: aí acontece um match – bingo! – os dois sozinhos poderão paquerar virtualmente, conversar e marcar encontro. Nem sempre a varinha mágica funciona, nem sempre há match, por isso é tentador continuar buscando. Outra coisa é a comodidade e flexibilidade de uso para conhecer alguém, – em casa onde seja, nos intervalos de trabalho, antes de dormir, – é suficiente a existência de WI-FI no lugar para se entrar na rede virtual de buscas. Também poder selecionar a busca por idade é para aqueles na faixa dos 50 ou 60+ a oportunidade de se concentrar neste grupo e fazer da busca algo bem especial.
Fato é que o número de solteiros em geral vem aumentando no Brasil, e com ele mudanças se revelam criando uma forma de cultura. Uma mulher jovem de classe média que vive de seu trabalho e podendo morar sozinha, ainda pensa em casar nos moldes de sua mãe ou avó? Menos viável. Melhor ela tenta harmonizar seu estilo de vida a um relacionamento e a uma futura família adequados, porque seus parâmetros que definem um marido, um parceiro não só são bem diferentes de antes, como mais exigentes, e aí está o problema – mulheres que impõem pré-requisitos, dão prioridade a seus interesses e não se deixam levar pelas aparências, também querem determinar sua vida a dois, mas sem perder o encanto do amor. É possível? Essas mulheres não são compreendidas por homens bitolados em seus esquemas retrógrados – por outro lado, espero que elas também não precisem deles, mas nem por isso é simples assim. Por mais que mulheres tenham lutado pelos seus direitos na sociedade, não significa isso que elas tenham deixado de sonhar e idealizar modelos impossíveis.
O Tinder garante um espaço secreto nos chats, já que muitos dos participantes preferem não se alongar em seus perfis, mas priorizar nas fotos. Estas procuram satisfazer às tendências das redes sociais: as pessoas devem aparecer bonitas, atraentes, alegres e sociais, o que esta padronização leva a um anonimato para proteger a identidade. O que ele espera de mim? O que ela quer de mim? O que eu quero? Acho que só poucos se perguntam; o importante é ter expectativas e estar ligado no aplicativo como tantas outras pessoas – este aspecto dá conforto e segurança, apesar de conhecer, encontrar alguém por meio de um aplicativo de relacionamento é uma aventura, pois a pessoa aparece como algo isolado, pouco ou nada relacionado com outros aspectos da vida, saída de repente não se sabe de onde. Isto me faz lembrar dos flertes de minha juventude, – apenas nos olhávamos, talvez só uma vez por dia no ponto de ônibus, mas isso provocava ânsia e desejo de rever a pessoa. O tempo até que nós chegássemos a falar um com o outro nos enchia de expectativas e esperança, assim como dava a chance de averiguar sobre a pessoa, procurar saber quem ela é. Era muito bom.